27- O casulo e a árvore I



Quando a mãe de Sofia voltou da Índia, a primeira coisa que ela notou foi o rosto da mãe. Estava diferente. Tinha a expressão suave. Não era aquele rosto tenso, que sempre voltava das viagens, já pensando no trabalho a seguir. Estava tranquilo.
Normalmente sua mãe voltava cheia de coisas para fazer. A primeira coisa, era checar a caixa de e-mails. Depois, tomava um banho e checava as correspondências. Dava uns telefonemas e resolvia as questões mais importantes. Só depois, jantava com a família e ia conversando, sem parar, até todos irem para a cama.
Desta vez, a mãe estava diferente. Tanto, que quando chegou, jogou logo as malas no chão da sala e correu para os braços da família. Se entregou em abraços longos e tranquilos. Beijou ternamente. Olhou intensamente, cada um.
Sofia não sabia explicar. A mãe era uma "dondoca", como dizia seu pai, quando ela atrasava os compromissos em comum.
Sofia nunca viu a mãe sair de casa sem maquiagem. Esse era outro mistério. Quando Sofia olhou pra sua mãe, viu que ela não usava maquiagem. Apenas um lápis realçando os olhos e pouco brilho nos lábios.
E os cabelos? Aquele coque que ela chamava de,"próprio para seu look executivo", não estava mais ali. Preso no alto da cabeça, como uma coroa de marfim. Estavam soltos, levemente desalinhados.
Sofia achava aquilo tudo, muito bom. Estava morrendo de saudade da mãe.
Ao invés de subir as escadas correndo, tirou os sapatos e jogou junto com suas malas. Displicente. Caminhou até o jardim. Ia falando devagar.
"Senti tanta coisa nesta viagem. Como vocês não estavam comigo, lembrei de histórias que nunca contei antes. Prometi conta-las assim que voltasse. É uma forma que encontrei de poder dizer que estaremos sempre juntos.
Para você, Irene. Uma noite, em Mumbai, cheguei tarde e muito cansada no hotel. Quando finalmente deitei, comecei a me lembrar de você e o quanto me preocupo com sua saúde. Chorei, daquele jeito que vocês já sabem. Me deu vontade de sair correndo e voltar para casa, mas não podia.
Conforme chorei, fui me lembrando de uma vez que você, Irene, chegou aqui neste jardim e me viu chorando. Querendo me distrair, pediu para que eu olhasse sua tartaruga na fonte. Quando olhei, vi o seu reflexo e o meu. Atrás de nós duas, havia um céu maravilhoso, cheio de estrelas. A lua parecia brincar entre nós. Lembrar dessa história na Índia, me fez acalmar o medo de estar longe de você e consegui dormir".
Lembrar a volta trancedental de sua mãe à Índia, foi a primeira coisa que Sofia fez ao acordar naquela manhã. O quarto estava escuro, mas ela sabia que era dia.

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